sábado, 3 de fevereiro de 2018

I Jogos Florais do Jornal E, de Estremoz



REGULAMENTO
1 -
Os I JOGOS FLORAIS DO JORNAL E DE ESTREMOZ são uma iniciativa deste jornal, que visa assinalar a decisão recente da UNESCO de inscrever os “Bonecos de Barro de Estremoz” na “Lista Representativa do Património Cultural Imaterial da Humanidade”.
2 -
Aos Jogos Florais podem concorrer todos os cidadãos nacionais e estrangeiros abrangidos pelo que se dispõe no presente regulamento.
3 -
Só são admitidos a concurso trabalhos inéditos, redigidos em Português e nas seguintes modalidades:

A - QUADRA POPULAR

Tema: "BONECOS DE ESTREMOZ".

Em redondilha maior, de rima ABAB, uma quadra em cada folha.

B - POESIA OBRIGADA A MOTE

Mote:

Bonecos de Estremoz são,
Em variada forma e cor,
Filhos d’arte de artesão
Que os modela com amor.

(António Simões - Estremoz)

Nota: não descurando outras formas de glosar o mote, daremos especial atenção ao tratamento em décimas.

C - POESIA LIVRE
Subordinada ao tema: "BONECOS DE ESTREMOZ".
4 -
De cada trabalho serão enviados três exemplares, dactilografados à máquina ou em computador em papel formato A4, de um só lado. Os trabalhos não poderão ser adornados com moldura ou qualquer outro ornamento.
5 -
Todos os trabalhos deverão trazer na primeira página a modalidade a que concorrem, terão que ser subscritos por um pseudónimo, devendo os respectivos autores enviar anexo a cada trabalho, um envelope fechado com o pseudónimo dactilografado no rosto, e dentro, o nome, morada e número de telefone do Autor.
6 -
Cada concorrente poderá apresentar dois trabalhos por modalidade, com excepção da QUADRA onde poderão ser apresentados três trabalhos a concurso, pelo que cada um será subscrito com pseudónimo diferente. Serão desclassificados os trabalhos que não sejam inéditos, isto é, que já tenham sido apresentados noutros concursos.
7 -
O prazo de remessa dos originais (data de carimbo dos correios) termina em 31   DE MARÇO DE 2018 e deverão ser enviados, para:
Jornal E de Estremoz
Apartado 135
7101-909 ESTREMOZ
8 -
O não cumprimento do estipulado no presente regulamento, anula a apreciação dos trabalhos pelo júri, de cujas decisões não cabe recurso.
9 -
As classificações serão tornadas públicas em 3 de Maio de 2018, sendo os concorrentes avisados por escrito.
10 -
Haverá três prémios por modalidade, bem como as menções honrosas que o júri entender por bem conceder. Poderá, no entanto, deliberar a não atribuição de qualquer prémio, numa ou mais modalidades, se considerar que a qualidade dos trabalhos apresentados não é consentânea com a projecção que se pretende para esta iniciativa.
11 -
 A entrega de prémios aos galardoados terá lugar no dia 12 de Maio de 2018, em Estremoz, no Auditório da Escola Secundária da Rainha Santa Isabel, a partir das 11 h.
12 -
 Estes Jogos Florais ficam interditos aos elementos do Júri e demais pessoas envolvidas na organização dos mesmos.
13 -
Ao Júri cabe a resolução de qualquer ocorrência que não seja abrangida pelo presente regulamento.

quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

Poesia Portuguesa - 089


RETRATO DE FERNANDO PESSOA (1954).
Almada Negreiros (1893-1970).
Óleo sobre tela (201 x 201 cm).
Museu da Cidade, Lisboa.

Todas as cartas de amor são ridículas
Álvaro de Campos (1890-1935)

Todas as cartas de amor são
R
idículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas. 
Também escrevi em meu tempo cartas de amor, 
Como as outras, 
Ridículas. 

As cartas de amor, se há amor, 
Têm de ser 
Ridículas. 

Mas, afinal, 
Só as criaturas que nunca escreveram 
Cartas de amor 
É que são 
Ridículas. 

Quem me dera no tempo em que escrevia 
Sem dar por isso 
Cartas de amor 
Ridículas. 

A verdade é que hoje 
As minhas memórias 
Dessas cartas de amor 
É que são 
Ridículas. 

(Todas as palavras esdrúxulas, 
Como os sentimentos esdrúxulos, 
São naturalmente 
Ridículas.)


Álvaro de Campos (1890-1935)

terça-feira, 30 de janeiro de 2018

A berardização da paisagem rural


Herdade das Carvalhas na estrada da Glória (Estremoz).

A identidade cultural alentejana       
O Alentejo tem marcas identitárias que o distinguem de qualquer outra região do país. São elas: a paisagem, o carácter do povo alentejano, a casa tradicional, o traje popular, os produtos regionais (ervas medicinais, azeites, vinhos, queijos, enchidos), a gastronomia, a arte popular, a tradição oral (adagiário, lendas, adivinhas, lengalengas, gíria popular, alcunhas, cancioneiro), o folclore (cante e saias), os jogos populares, os usos e costumes, etc.
Estas marcas identitárias conferem uma imagem de marca ao Alentejo, da qual muito justamente se orgulham e com a qual se identificam os alentejanos, tanto naturais como adoptivos. É o somatório desses timbres e da oferta turística, que é gerador de fluxos visitadores que muito contribuem para a economia regional. Daí ser preciso, imperioso e urgente que cada um de nós tenha consciência dessa identidade cultural e lute pela sua preservação, valorização e aprofundamento. Essa a razão da presente crónica.
A subversão das marcas identitárias
Quem transita pela estrada da Glória, ao chegar à Herdade das Carvalhas, fica atónito com a mudança de visual. A começar pela nova designação, que depois de travestida passou a ser a da marca “Quinta do Carmo”. Depois, ressalta à vista, a plantação de palmeiras de estaca, junto ao muro que bordeja a estrada. E por fim, blocos de mármore, pintados com cores variegadas e empilhados uns sobre os outros, formando conjuntos de altura variável. Que farão ali naquele cais? Será que aguardam a chegada de camiões de carga que os transportem ao Carnaval de Cascais? Não creio.
Não sou arquitecto paisagista, mas como regionalista convicto e esclarecido, julgo ser legítimo concluir que estamos perante um exemplo manifesto de lamentável “berardização” da paisagem rural. Aos que possam desconhecer a semântica de tal conceito, direi em bom e puro alentejano que consiste em “albardar o burro à vontade do dono”, manifestando um desprezo olímpico pelos usos e costumes locais, consignados pela tradição.
Dir-me-ão alguns que por ali não há burros e não me custa admitir que assim seja. Já quanto a camelos não estou tão certo, uma vez que é uma associação inescapável a que sou conduzido pela presença intrusa das palmeiras.
A prima Hifigénia, mulher de virtudes e com dotes de pitonisa era capaz de agourar:
- Para a imagem de califado ser ainda mais forte, só ali faltam tendas com beduínos a fumar narguilé, já que camelos não devem faltar.
Todavia e com grande mágoa minha, a prima já não pertence ao reino dos vivos. Contudo, o registo memorial das suas sábias alocuções, permanece perene nos nossos espíritos.

Hernâni Matos 
(Texto publicado no jornal E nº 192, de 25-01-2018)

segunda-feira, 29 de janeiro de 2018

Poesia portuguesa - 088


 

Fado de não morrer
António Simões (1934- )

Não morreste, eu não deixei,
De mim não te afastaste,
Obediente à minha lei
De não deixar morrer a haste
Da árvore que eu plantei,
E em minha alma ficaste.

Os amigos que perdi,
Ao pé de mim sempre vão,
Tenho-os todos aqui, 
Dentro do meu coração.
Foi para isso que eu nasci:
Não deixar morrer ninguém,
Nem pai, nem filho, nem mãe.
Batam palmas, ovação,
Que eles bem vivos estão:
Os que se julgam perdidos,
Trago-os presos aos sentidos
Aos gestos do dia-a-dia;
Vejo-os em todo o lado,
Tal como eram outrora.
Por isso canto este fado
Cheio da pura alegria
Onde a vida se demora
E a morte não tem lugar.
Vamos lá todos cantar,
Amigos, chegou a hora
De celebrarmos a vida –
Tudo feito de tal sorte,
Com força tão desmedida,
Que para longe fuja a morte,
E fique lá esquecida
No mais remoto lugar:
Amigos, vamos cantar!

António Simões (1934- )
Hernâni Matos 

quarta-feira, 24 de janeiro de 2018

De Arraiolos não vêm só tapetes


Capa de Alberto de Souza (1880-1961) para o livro “TAPETES DE ARRAYOLOS”,
editado em 1917 por D. Sebastião Pessanha (1892-1975).

É um tremor de terra, Hernâni!
Era um fim de manhã soalheiro de Janeiro. Sentado à secretária, filigranava uma farpa literária destinada a alguém, que algures dela é merecedor. Da cozinha chegava-me às narinas um olor carnal a ensopado de borrego que apurava no fogão. O aroma das especiarias excitava-me o olfacto e o palato.
De repente, sinto um abanão que me induz a vibrar solidariamente com a casa onde moro. Simultanea e sincronicamente, as vidraças da janela começam a tremer com um nervoso que nada tinha de miudinho. Como sou um penso rápido, disse para comigo mesmo:
- “ É um tremor de terra, Hernâni!”
Não deu para rezar a Santa Bárbara, já que não se tratava dum castigo do Céu. Aquilo era obra do Demónio, congeminada nas entranhas da Terra. Havia que sair rapidamente de onde estava, pelo que me levantei da cadeira como que impulsionado por uma mola. Atravessei a sala de jantar, na qual o lustre oscilava e os copos tilintavam nas cristaleiras, em sintonia com as vidraças. Era um concerto para fugir dali. Por isso, desci dois lances de escada a uma velocidade que só eu sei, no que fui acompanhado pela patroa. Chegados à rua, não se falava noutra coisa e cada um relatava a sua experiência pessoal.
Tem a palavra o IPMA
Decorrido algum tempo, o IPMA divulgou a seguinte nota informativa, a qual foi transmitida pelos média:
“O sismo que ocorreu às 11:51 (UTC), com uma magnitude ML=4.9, localizou-se na região NE de Arraiolos, perto de Aldeia da Serra. O hipocentro (preliminar) tem as coordenadas 38.779 N, 7.960 W e a profundidade de 11.8 km.
Indicando um mecanismo focal em desligamento direito, compatível com as determinações realizadas para sismos que ocorreram anteriormente na mesma região, de que é exemplo o sismo ocorrido em 31 de julho de 1998 com magnitude 4.
Este sismo ocorre numa conhecida área de sismicidade, designada habitualmente por “cluster sísmico” de Arraiolos, onde os acidentes morfológicos e os estudos geológicos apontam para uma orientação dominante WNW-ESE. A origem destes sismos está associada a uma zona de transição entre uma área relativamente calma sismicamente a norte, e uma área mais ativa sismicamente a Sul, dentro de uma zona denominada “Zona de Ossa-Morena”, caracterizada por soco Paleozóico da Península Ibérica que no Alentejo apresenta falhas orogénicas WNW-ESE e falhas frágeis tardi-variscas (pós-orogénicas) com a mesma orientação. A morfologia e em particular a rede drenagem tem a mesma orientação desta fracturação.
O IPMA enviou já uma equipa de sismologistas para realizar o inquérito macrossísmico na região. Este inquérito é importante para a caracterização do risco sísmico na região.”
13 badaladas na Torre dos Congregados
Entretanto, soaram 13 badaladas na Torre dos Congregados. Foi como que um toque de clarim, em jeito de ordem para eu dispersar. Tinha chegado a hora regimental de começar a dar ao dente e iniciar a mastigação. Chegado a casa, as escadas foram mais fáceis de subir que de descer, ao contrário do que se passou com Veloso, tal como nos relata Camões no Canto V dos Lusíadas.
O ensopado não se escapou, tal como o borrego não se tinha escapado e daí a razão de haver ensopado. A pinga também não se escapou e desta feita tive direito a reforço, já que com o estremeção não ganhara para o susto.
A feitura desta crónica interrompeu a farpa literária que tinha entre mãos. Alguém terá dito:
- “Enquanto o pau vai e vem, folgam as costas!”
A isso eu respondo:
- “Deixa estar, que não perdes pela demora!”

Hernâni Matos 
Reporter de abanões e tudo
(Texto publicado no jornal E nº 192, de 25-01-2018)

terça-feira, 23 de janeiro de 2018

Senhor Doutor Hugo Guerreiro, sinta-se condecorado!


Ivone Carapeto (Advogada, Directora do jornal E, de Estremoz)
DR
Para tudo devemos procurar a explicação mais simples: os elementos do MIETZ que integram o executivo camarário estremocense chumbaram a proposta de atribuição da medalha de mérito municipal a Hugo Guerreiro, Diretor do Museu Municipal Professor Joaquim Vermelho, porque ela veio do PS. Essa é a singela razão que levou à reprovável posição de ingratidão do município relativamente a um dos seus e que encabeçou o projeto com maior impacto de sempre na vida cultural da cidade: a classificação do figurado de barro de Estremoz como Património Cultural Imaterial da Humanidade.
Contra a atribuição da medalha de mérito municipal, o Presidente da Câmara alegou que tal não seria justo para todas as outras pessoas envolvidas na candidatura, nomeadamente ele, as senhoras Vereadoras e todos os outros funcionários ou mesmo alguns membros do governo que ajudaram no processo.
Mas é óbvio que essa não é a razão. É óbvio que o executivo MIETZ bem sabe que Hugo Guerreiro, coordenador da candidatura é o rosto dela e o responsável técnico máximo sem o qual uma boa ideia não teria saído do papel. E é também certo que se a ideia de o distinguir com a medalha de mérito municipal tivesse saído da liderança do município, Hugo Guerreiro teria a sua medalha.
A verdade é que, com ou sem razão, o executivo MIETZ recebeu a proposta do PS como uma provocação. Se foi ou não, não sei e não interessa para aqui.
Facto é que Hugo Guerreiro era merecedor da distinção que apenas não lhe foi dada, na minha humilde opinião porque proposta pela oposição. A cidade ou, pelo menos, aqueles que entendem o trabalho que aquele técnico superior do município fez e tudo o que esse esforço significa para os estremocenses do passado, do presente e do futuro gostariam que um louvor tão consensual não tivesse descambado em conflitos de política “partidária”. Não havia necessidade. Senhor Doutor Hugo Guerreiro, as medalhas são meros objetos. Mais bonito que recebê-la, teria sido dá-la. Sinta-se condecorado!

Ivone Carapeto
Advogada, Directora do jornal E, de Estremoz
(Texto publicado no jornal E nº 192, de 25-1-2018)


Hernâni Matos

Bonecos de Estremoz: preservar e salvaguardar a memória de uma forma de expressão da cultura popular


Diogo Vivas (Arquivista, doutorando em Ciência da Informação)

O reconhecimento da produção de figurado em barro de Estremoz, vulgarmente conhecida por “Bonecos de Estremoz”, como Património Cultural Imaterial da Humanidade pela UNESCO, no decurso da 12.ª reunião do Comité Intergovernamental para a Salvaguarda do Património Cultural Imaterial, que decorreu em Jeju (Coreia do Sul), no passado mês de Dezembro deve, a todos, encher de orgulho.
Devemos reconhecer, além do labor e da criatividade das mãos que, geração após geração, ao longo dos séculos, souberam transmitir uma forma muito peculiar de trabalhar o figurado de barro, o papel determinante do Professor José Maria de Sá Lemos, então director da Escola Industrial António Augusto Gonçalves, nas décadas de 30-40 do século passado, na revitalização de uma arte quase extinta.
O trabalho desenvolvido, primeiramente, com Ana Rita da Silva, vulgo “Ti Ana da Peles” e, numa segunda fase, com Mariano da Conceição, permitiu recuperar uma arte secular que os artesãos seguintes souberam dar continuidade até à actualidade, criando e recriando, ao jeito dos barristas do passado.
Na pessoa do mais novo dos artesãos, Ricardo Fonseca, felicito todos os ceramistas. Congratulo-me, em particular, pela sua coragem em abraçar semelhante desafio e que seja o estímulo para que mais jovens se interessem por esta forma de expressão da cultura popular estremocense, assegurando a sua continuidade num mundo globalizado.
Uma palavra de reconhecimento a todos os investigadores que ao longo dos tempos se têm dedicado ao estudo desta temática. A sua reflexão e produção intelectual constituíram a tão necessária memória escrita, fundamental, não só para o sucesso da candidatura, mas também para a sua preservação e conservação futuras.
Não poderia, contudo, deixar de recordar os arquivos/ bibliotecas e os testemunhos/ memorias orais, que serviram de suporte a muita da investigação desenvolvida. Destaco, particularmente, a Biblioteca e o Arquivo Municipal de Estremoz e a pesquisa desenvolvida pelos seus técnicos, num trabalho (in)visível e moroso, de inegável valor.
Um voto de felicitações à comissão que conduziu o processo de candidatura pela perseverança com que desenvolveu o seu trabalho bem como a todas entidades que directa ou indirectamente se envolveram neste processo.
Termino com um desafio ao Município de Estremoz, para a criação de um Centro de Documentação e Informação, em homenagem ao homem que, no século passado, de forma visionária, resgatou da extinção os “Bonecos de Estremoz”: o Professor José Maria de Sá Lemos (1892-1971). Um centro que reunisse a sua obra artística assim como a biblioteca e arquivo pessoais; apoiasse e desenvolvesse actividades de investigação e de aprofundamento de estudos em torno de temáticas afins e procurasse editar estudos e reunisse os textos dispersos da sua autoria.
Diogo Vivas
Arquivista, doutorando em Ciência da Informação
(Texto publicado no jornal E nº 192, de 25-1-2018)

Hernâni Matos